terça-feira, 12 de abril de 2011

leiteiro da Jaguaruna

Leiteiro da Jaguaruna

Como já comentamos havia um lindo e rico arroio chamado Arroio Corrente que emprestava seu nome à praia e se originava na lagoa do Arroio Corrente. Cruzava serpenteando toda a faixa de dunas que tinha a largura aproximada de 1500 m desde a lagoa até o mar.
Este riacho tinha grande população de crustáceos como lagostim e pitu. Uma variedade enorme de pequenos peixes com cores e formas diferentes que colecionávamos em vidros e latas com a intenção de montar aquários em tentativas frustradas pela impropriedade do intento. A água do riacho era límpida e dela bebíamos diretamente quando tínhamos sede e passávamos o dia dentro dele com variadas brincadeiras entre represas e lançamento de barquinhos.
O sr Maneca morador da região próxima à lagoa, onde tinha bom pasto suficiente para criar vacas. Como uma de suas atividades vendia leite de casa em casa. Transportado em latões zincados, daqueles com boca grande. Utilizando uma caneca de lata de azeite feita em latoeiro como medida, servia à maioria dos veranistas da comunidade. Seu produto parecia de boa qualidade, comumente apresentava na sua superfície uma crosta de nata que era coada. Evidentemente era fervido para depois ser consumido. Num belo dia ao servir a medida solicitada de dois litros houve um fato que gerou esta estória.
Surpresa, minha mãe falou - Seu Maneca tem uma piava nadando neste leite! O Sr esta misturando água?
Ele como se já tivesse a resposta preparada, de pronto contestou –
O Dona! - que nada!
Levantando o chapéu de palha com a ponta do dedo indicador falou –
- Eu bem que avisei para minha mulher que era um perigo deixar as vacas beberem água no arroio antes de tirar leite.

Dona Romana

Dona Romana era uma veranista da praia de que vinha da região de Urussanga /Orleães, de origem italiana, falava com sotaque característico.
Muito religiosa tinha um papagaio que repetia sua cantoria de igreja e outras orações quando estimulado por ela.
Todo inicio de verão era uma alegria quando procurávamos a D. Romana ela no seu varandão e nós diante da casa para que o bichinho fizesse a exibição mostrando tudo que havia aprendido naquele ano. Estimulado acompanhava cantando ”Louvando Maria” e outras tantas músicas e ladainhas.
Num dos verões que se seguiram chegou D. Romana e seu papagaio não, ele havia fugido. Ficamos todos tristes pela perda de figurinha tão especial. No ano seguinte fomos buscar notícias e perguntada pelo seu fiel seguidor ela contou que numa tarde durante aquele ano ela ouviu um som de reza forte vindo do céu.
Qual não foi a sua surpresa quando viu seu papagaio na frente de um bando deles. Ele rezava puxando a ladainha e o restante em coro respondia cantando os estribilhos.

Sr Bonifácio

Sr Bonifácio
O Sr Bonifácio não sabia quantos anos tinha, mas, já era de grande idade quando o conheci. Minha avó que era baiana dizia que na compra de escravos uma premissa era observada "Negro quando pinta três vezes trinta." Isto significava que se aproximavam de noventa anos aqueles cujos cabelos eram brancos.
Seu Bonifácio era grisalho, com mais cabelos brancos do que pretos. Independente disto tinha um lindo coração comandado por total inocência. Morava sozinho e isolado nas margens da Lagoa do Arroio Corrente num casebre de um só cômodo onde nos cantos ficavam sala, quarto, cozinha, uma mesa para as refeições e seu banheiro era o mato circundante. Nunca lhe faltava proteína, pois sempre tinha pequenos peixes em seu covo, estrategicamente colocado entre os juncos em frente à sua casa que era toda cinza pela madeira sem pintura exposta ao tempo e à fuligem de seu fogão/fogueira. Quando ia até a praia era este o seu perfume que bem o conhecia seu pequeno cachorro.
Seu sonho era ir para outro local mais próximo da civilização e de onde talvez fosse possível tirar algum proveito.
Após muitas tratativas e conversações o seu Bonifácio conseguiu material para fazer uma casa em frente ao Camilo junto à porteira com quem passou a dividir o pedágio pela sua abertura.
Sua nova casa logo foi reformada com a construção de um segundo compartimento aos fundos.
Este fato o encheu de orgulho e o nobre proprietário passou a dizer:
- Agora sim estou contente!
- Por que Bonifácio?
- Nossa homem! - hoje tenho uma casa de dois pavimentos.
- Como assim?
- Ora! - um na frente outro atrás.

Sr Camilo

Camilo-
O Sr Camilo, era homem simples que morava na praia da Jaguaruna cujo nome é "Arroio Corrente". A praia composta por extensa área de dunas de areia branca ou creme, interrompida pelo Arroio Corrente, sangradouro da lagoa. Esta lagoa do "Arroio Corrente" é grande, com água doce e límpida apesar da cor negra pela sua profundidade e depósito de matéria orgânica, onde se podia pescar taraíra, cara e com muita sorte algum pitu de longas garras. Próximo à lagoa existia plantação de milho, feijão, melão cheiroso, melancia e pastos com criação de animais. Na estrada que levava à vila se instalou uma porteira para impedir a passagem destes animais para a praia. O Sr. Camilo morava num pequeno rancho que restava coberto pelas dunas no final dos períodos de vento sul.
A comunidade resolveu fazer uma casa próxima à porteira para ele abrigar sua numerosa prole. Do obséquio de abrir a porteira para cada viajante que chegasse a cobrar uma espécie de pedágio, foi muito rápido. Na freguesia moravam ainda o Sr. Geronimo, preto gordo e grande que realizava algumas tarefas, Teófilo que muito gostava no fim da tarde de um trago de butiá ou losna para tratar o fígado. Nego Osni como era chamado, a quem não se podia contar uma anedota porque ele literalmente rolava no chão de tanto rir. Sr Jorge que atuava de eletricista e o Sr Jaci dono da venda, cujas anotações nos cadernos de compras necessitavam constantemente de tradutor especial.
No bar do Jaci reuniam-se todos para a prosa do final do dia e ingresso na noite, já tarde, voltavam para casa, prontos para dormir.
Em frente à praia na linha do horizonte, há uma afloração de pedras chamada de Parcel do Campo Bom que se pode ver graças à espuma das ondas que nela rebentam. É uma formação que reúne peixes de passagem e moradores das pedras. Seu perigo para a navegação é tal que na luz do farol de Santa Marta é marcado com facho de luz vermelha.
Junto a este arrecife eram colocadas redes de espera que lá dormiam. Em canoas bordadas de um só tronco, os pescadores iam remando num dia para deixar e outro para recolher. Voltavam com grandes miraguaias, cações mangona e tubarões martelo , daqueles com muitas fileiras de dentes. Decantando sua coragem e capacidade de nadar, o Sr Camilo contava no bar do Jaci que em uma destas idas foram surpreendidos por uma borrasca de ventos fortes, ondas grandes e mar revolto e ele que fazia parte da emenda como lançador, foi jogado fora da embarcação. Ficou perdido no meio das espumas, remando e lutando muito, seus companheiros chegaram à praia, enquanto ele ficou nadando, um dia, dois dias e no final da semana quando chegou na praia não podia caminhar com liberdade de tanto mariscos e ostras que tinha agarrados ao seu corpo.